segunda-feira, 28 de outubro de 2013

CARTA ABERTA SOBRE A PONTE D.MARIA II



CARTA ABERTA SOBRE A PONTE D.MARIA II, EM LAGOS              
           No estudo de uma estrutura, o engenheiro entra com 20% de técnica, e 80% de cultura
                                                                                                  Edgar Cardoso, engenheiro civil
   
                                               

A ponte de D.Maria II em Lagos, é elemento decisivo para o equilíbrio da estrutura urbana da cidade de hoje, e tem um papel fundamental entre o seu mais rico património histórico e de memória.

A CDU, consciente desta indesmentível realidade, quer urbanística, quer cultural, entende que, em nome da transparência democrática na vida da cidade, a situação actual exige que a população esteja informada do caminho para a correcta solução a dar à ponte, para hoje e para o futuro.

De origens remontando a uma data imprecisa, talvez que da Antiguidade, a ponte D.Maria II, constituída por 12 arcos de volta perfeita, em alvenaria, fez parte da EN125 como a única ligação, com uma só faixa de transito, entre as duas margens da Ribeira de Bensafrim, e portanto também único acesso de Lagos para a Meia Praia.  As diferenças de amplitude entre arcos da ponte, devem-se a sucessívas reconstruções parciais, por destruições devidas a terramotos e enxurradas, já aparecendo como arruinada na planta da Baía de Lagos de 1794.

No final da década de 1950, o tabuleiro original foi demolido e alargado para duas faixas de rodagem, com uma laje de betão armado sobreposta na arcaria de alvenaria. O erro técnico de simplesmente apoiar uma estrutura de material dinâmico num suporte de material inerte, aliou-se ao erro cultural de descaracterizar um importante elemento do património histórico de Lagos.

Aquele erro técnico, agravado com o transito pesado de 5 décadas, provocou o hoje visível risco de eminente ruina de alguns arcos, e a ponte foi encerrada ao tráfego, pedestre e de veículos, por parecer do Laboratório Nacional de Engenharia Civil.

A indispensabilidade de eliminar o erro técnico que esteve na raiz do encerramento da ponte, cria a oportunidade de reparar o erro cultural, pois que em termos de gestão do território, e neste caso com perspectiva urbanística, quando uma ponte já não satisfaz a sua função, alia-se a técnica à cultura, e constrói-se outra.

Para apoiar este argumento, não seriam precisos outras razões além do bom senso e da boa gestão. No entanto, vejamos que, com problemas exactamente identicos de retirada de estradas nacionais de pontes que já não satisfaziam, construíram-se novas pontes em Silves, em Portimão, em Tavira, substituindo as pontes existentes, que se mantiveram para outras funções e foram até valorizadas como património histórico. Mesmo a outra escala, em Lisboa, no Porto, em Coimbra, como aliás por todo o mundo, casos similares foram resolvidos com novas pontes.

Sem rigorosamente nenhum prejuízo de caracter técnico rodoviário, e com todas as imensas vantagens de caracter cultural e de responsabilidade perante o futuro, também Lagos tem óptima solução para o seu problema.

A CDU considera que essa solução será, muito simplesmente, construir uma nova ponte do lado poente do Pingo Doce, desviando o arruamento ali existente, para o ligar ao arruamento existente na margem direita, até junto do nó da rotunda do barco.

A ligação rodoviária com a Meia Praia ficará, na prática, em tudo idêntica à que está interrompida. Ficará ainda proporcionado o acesso directo da margem esquerda ao Complexo Desportivo.

Ao mesmo tempo, assim se enriquecerá Lagos com a recuperação da valiosa originalidade patrimonial da ponte de antes de 1950, destinando-a exclusivamente para transito pedestre, portanto sem os custos das exigências técnicas para admitir cargas pesadas. Da mesma maneira, ficarão satisfeitos todos os interesses envolvidos, públicos e privados, urbanísticos, culturais, comerciais.

Perder esta oportunidade, será um imperdoável crime urbanístico/cultural, se porventura se insistisse em manter todos os erros que na obra dos anos 50 do século XX, e inacreditavelmente repetidos no Plano de Urbanização de Lagos de 2008, incidiram sobre o património histórico e de memória que é a ponte de D.Maria II, na autenticidade da sua antiga forma.

Em contrapartida, a nova ponte, dos dias de hoje, será um contributo inestimável, tanto como expressão da técnica e da cultura da nossa época, como na estruturação harmoniosa do futuro de Lagos.

A CDU vê este caso como de extrema urgência, o que, não querendo dizer precipitação, significa que merece amplo debate público abrangendo a população, os saberes técnicos, os valores culturais e os interesses abrangidos.

Por isso, a CDU divulga esta Carta Aberta.

Lagos, Outubro.2013
A CDU de Lagos

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