sábado, 1 de setembro de 2012

FESTA DO AVANTE!



A Festa do Avante!
e o colectivo comunista
              
por Miguel Urbano Rodrigues 
                                    
Tive a oportunidade de acompanhar na Europa e na América Latina festas de Partidos Comunistas. 
               
Não conheci Festa como a do Avante!
                                  
É diferente pela concepção e pelo objectivo, mas sobretudo pela atmosfera humanizada.
Não esqueci a primeira Festa, em Alcântara, no Pavilhão da Feira das Indústrias no ano 76 do século passado.
Foi um grande acontecimento popular, mas ficou logo transparente que aquele espaço era inadequado. No ano seguinte a Festa mudou-se para o vale do Jamor, e adquiriu um formato diferente, a céu aberto.
Durante os seus três dias atraiu multidões.

Pela dimensão e pelo seu significado político, a iniciativa começou a incomodar a burguesia. A Câmara de Lisboa, proprietária dos terrenos do Jamor, criou tais entraves à cedência do lugar, que a Festa, no seu quarto ano, foi forçada a mudar-se para as colinas do Alto da Ajuda, um descampado de difícil acesso na periferia da capital.
Mas para desespero da direita o êxito não parou de crescer. O prestígio da Festa atravessou as fronteiras e a participação de dezenas de partidos comunistas e outras organizações progressistas em stands próprios e a sua presença no comício de encerramento conferiram projecção internacional ao grandioso convívio revolucionário dos comunistas portugueses.

A campanha que visava o seu apagamento prosseguiu e intensificou-se. A Festa foi escorraçada do Alto da Ajuda e transferida para Loures, um município então comunista, contíguo a Lisboa.
Aí se instalou durante dois anos. Em trânsito, porque a direcção do PCP, tirando conclusões da perseguição permanente à sua Festa, tomou a decisão de criar para ela uma sede própria.
Encontrou-a na Quinta da Atalaia, uma antiga exploração agrícola, situada à beira da Margem Sul do estuário do Tejo, um recanto verde e tranquilo de serena beleza.
Porventura mudou a Festa ao adquirir um estatuto sedentário desde 1990?
Sim e não.

É a 34.ª. Mais organizada, sem poeira, com maior presença da cultura-espectáculos, música, canto, dança, teatro, cinema, pintura, literatura, exposições, conferências, debates, etc. – continua a ser um acontecimento político promovido por um Partido que se assume como marxista-leninista, mobilizado para a luta contra o capitalismo e a construção do socialismo.
A componente ideológica não impede que a Festa reflicta a imagem da diversidade de Portugal.
Cada distrito no seu espaço – concebido e instalado pela organização regional – apresenta a imagem de Portugal na perspectiva comunista, desde as lutas revolucionárias da sua gente à produção, à cozinha e ao artesanato.
Ao abrir as portas, (quase) sempre no primeiro fim-de-semana de Setembro, cada Festa é o desfecho de 20 000 horas de trabalho voluntário de 12 000 militantes (e amigos) realizado ao longo do ano.

A atitude comunista

O que falta hoje na Festa? Não é fácil encontrar ali ausências porque além dos stands das regiões o visitante descobre o Pavilhão Central (onde se pode aprender muito sobre a história do Partido), uma Cidade Internacional, os espaços do Livro, da Ciência, das Artes, da Juventude e da Criança, os pavilhões da Mulher, da Emigração, dos Imigrantes e outros.
Não há estatísticas sobre o total de pessoas que cada ano visita a Festa. Mas são muitas centenas de milhares.
A grande parte não é do PCP. O Partido tem hoje somente 70 000 filiados.

Mas a Festa gera um fenómeno de osmose que surpreende os estrangeiros. Irradia uma atmosfera de fraternidade que não é identificável em qualquer outra, um sentimento que transcende a alegria, comovente.
A atitude comunista está na origem desse contágio.
Merece referência o facto de dois destacados jornalistas, intelectuais de direita dos mais mediáticos de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa e Miguel Esteves Cardoso, terem dedicado artigos altamente elogiosos a essa atmosfera fraterna da Festa. Não esperavam encontrar «aquilo» e quase lamentam sentir a necessidade de afirmar que Portugal seria melhor se o povo tomasse como modelo o ambiente da Festa do Avante!
Ali não registaram atitudes agressivas, discussões azedas, cada um parecia amigo do desconhecido que lhe dirigia a palavra. 

São os comunistas portugueses seres excepcionais?
Não. A Festa desenvolve-se numa micro atmosfera profundamente humanizada. Uma criação comunista? Sim. É o grande colectivo do Partido, soma de homens e mulheres muito diferentes, que a torna possível.
Tal como acontece nas revoluções em que naqueles que por ela se batem se produz uma ascese que faz desabrochar as suas melhores potencialidades, na Festa do Avante! ocorre algo similar.
Ali emergem as virtudes; submergem, desambientadas, a hipocrisia, a inveja, a avareza, os instintos agressivos.
E os não comunistas são contagiados pela fraternidade, pela solidariedade comunista. Na Quinta da Atalaia transmutam-se durante três dias de Setembro.

O colectivo partidário recorda o 25 de Abril, vai mais longe, reencontra-se na Festa com o sonho comunista. O Portugal de hoje é uma terra de muitos párias e um punhado de multimilionários, submetida a uma ditadura do capital e do imperialismo.
Mas a esperança numa sociedade humanizada, melhor, permanece latente, viva. Essa esperança forte, quente, de incentivo à luta que Álvaro Cunhal conseguia transmitir como ninguém nos discursos de encerramento da Festa.
Abril parecia impossível e aconteceu.

O fim do refluxo das História pode tardar mas chegará inevitavelmente. Os comunistas portugueses não temem o futuro. Um dia Portugal será uma sociedade com a atmosfera de fraternidade de uma gigantesca Festa do Avante!

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