Defender a Escola Pública e o ensino
público:
um imperativo nacional
Por Jorge Pires, membro da Comissão Política do
Comité Central do PCP
Na abertura
do ano lectivo que agora está a terminar no ensino básico e secundário, o PCP
chamou a atenção para o facto de «este se iniciar mergulhado num oceano de
problemas que resultam de uma política educativa marcada por um ataque sem
precedentes contra os direitos constitucionais nesta área».
A
concretização do maior despedimento colectivo de professores de que há memória
no Portugal de Abril, milhares de auxiliares de educação estavam em falta nas
escolas por não ser realizado concurso para a colocação efectiva destes
trabalhadores, falta de psicólogos e atrasos na colocação de outros técnicos,
turmas sobrelotadas, famílias sem saber se iriam ter apoios da Acção Social
Escolar numa altura em que precisavam de adquirir os manuais e outros materiais
escolares, escolas sem os meios humanos e técnicos para poderem ajudar os
alunos com maiores dificuldades, centenas de escolas encerradas que obrigam a
deslocações de dezenas de quilómetros por parte de crianças do 1º ciclo do
ensino básico, e um corte de 800 milhões de euros que se fez sentir sobretudo
nos primeiros três meses do ano lectivo, foram alguns dos muitos problemas que
docentes, alunos e pais, se confrontaram na abertura do ano lectivo, com
consequências que se repercutiram negativamente ao longo dos últimos nove
meses.
Denunciámos
na altura que o governo, apesar de ter tomado posse apenas três meses antes,
começava a concretizar uma estratégia muito clara nos seus objectivos: destruir
a Escola Pública, aprofundar o processo já em curso de mercantilização do
ensino e elitizar o acesso aos vários níveis do conhecimento, como parte dos
compromissos assumidos com a troika internacional no Pacto de Agressão.
Se dúvidas
pudessem ainda subsistir sobre as verdadeiras intenções do actual governo nos
planos político e ideológico relativamente ao sistema educativo, a forma como
está a preparar o próximo ano, clarifica de forma inequívoca os seus
verdadeiros objectivos.
Quer os
conteúdos, quer os métodos que hoje norteiam a política educativa deste
governo, vão no sentido de desvalorização da formação da cultura integral do
indivíduo, promover um ensino que limita o acesso ao conhecimento, que reserva
apenas às elites, atribuindo aos filhos das camadas trabalhadoras apenas a
capacidade de adquirirem competências profissionais, ao serviço das
necessidades flutuantes do mercado capitalista.
A não ser
travada esta política, o compromisso constitucional do Estado português com o
paradigma de uma Escola Pública, liberta das imposições e dos interesses
privados que assegure a satisfação das necessidades de toda a população, está
claramente posto em causa.
A redução do
investimento na educação para o nível mais baixo do conjunto dos países da
União Europeia (3,8% do PIB), cujas consequências se farão sentir já no próximo
mês de Julho com o despedimento de milhares de docentes, agravando ainda mais a
taxa de desemprego entre este grupo profissional que em 2011 disparou 120% e o
corte de um conjunto de actividades de apoio aos alunos e à actividade lectiva
que os orçamentos das escolas não podem suportar.
Mas não
ficam por aqui as malfeitorias deste governo à Escola Pública:
- a
reorganização curricular que não é mais do que um ajustamento curricular aos
cortes orçamentais impostos pela troika, com a qual o governo sustenta o
despedimento de milhares de professores e coloca muitos outros em mobilidade
especial e empobrece o papel da escola, degrada a qualidade pedagógica e ataca
os direitos dos estudantes. Direitos que não serão garantidos nas propostas de
alteração ao Estatuto do Aluno em que o governo ao invés de agir sobre as
verdadeiras causas dos problemas que são de natureza política e social, aposta
no vector disciplinar e autoritário;
- o aumento
do número de alunos por turma num contexto já complexo com uma situação insustentável
de sobrelotação de muitas escolas e consequentemente das turmas, mesmo quando
integram alunos com necessidades educativas especiais, que terá consequências
no processo pedagógico, no insucesso e no ambiente escolar;
- a
constituição de mega-agrupamentos com milhares de alunos e sem qualquer
justificação pedagógica, apenas com objectivos economicistas. Decisões, muitas
delas tomadas à revelia das opiniões contrárias da comunidade educativa e
órgãos autárquicos, numa postura caracterizada pelo quero, posso e mando, que
apenas contribuirá para desumanizar a vida das escolas, pôr fim a uma gestão de
proximidade e promover a indisciplina e o insucesso escolares.
- as
alterações ao modelo de gestão, que segundo o próprio ministro visam consolidar
um processo que conduzirá certamente a que os futuros directores até hoje
professores, venham a ser substituídos por um gestor profissional fazendo
lembrar tempos passados de má memória, decisão que acabará de vez com o modelo
de gestão democrática que prevaleceu muitos anos após a revolução de Abril;
- o
encerramento de largas centenas de cursos de formação e educação, percursos
curriculares alternativos, sem qualquer alternativa garantida a milhares de
estudantes, são apenas algumas das muitas decisões que o Ministério da Educação
tem vindo a tomar a que se deve associar o despacho agora conhecido sobre a
organização do próximo ano lectivo, matéria que não foi alvo de negociação com
os sindicatos, a que o governo está obrigado, Despacho que deve ser entendido
como a cereja que faltava no bolo, uma peça de um puzzle onde já se encontram
os mega-agrupamentos, os currículos, mais alunos por turma, etc, que condiciona
a autonomia, reduz horários, reduz horas nas direcções das escolas e na
direcção de turma, apoia menos as escolas que mais necessitam desses apoios.
Para que o ciclo se feche ficam a faltar duas decisões muito caras à direita: a
liberdade de escolha e o cheque ensino
.
Também na
educação e no ensino há um rumo alternativo. O imperativo inadiável da luta
pela construção de uma Escola Pública e para todos, ao serviço dos portugueses
e do País, está nas mãos do povo, dos trabalhadores do sector educativo, dos
estudantes, contribuindo com a sua participação nesta luta decisiva para o
desenvolvimento integrado de Portugal.
Luta que
passa pela recusa de um sistema:
-que
desvaloriza social e profissionalmente todos os trabalhadores das escolas,
promove o desemprego e a precariedade e despreza os direitos laborais;
-que trata
os estudantes, não como sujeitos das suas aprendizagens, mas como meros
clientes à procura de um diploma.
Luta que
defende:
- o respeito
e valorização dos direitos dos professores, funcionários, psicólogos e técnicos
pedagógicos, elementos centrais de uma Escola Pública de qualidade;
- a garantia
da igualdade efectiva de oportunidades para todos e a Escola Pública Gratuita e
de Qualidade, como um instrumento central deste objectivo;
- a gestão
democrática das escolas.
- a garantia
das condições materiais e humanas necessárias para o normal funcionamento das
escolas;
- a garantia
efectiva da escola inclusiva e o cumprimento de direitos das crianças e jovens
com necessidades especiais.
- a Escola
Pública como um espaço de emancipação individual e colectiva, determinante para
a defesa/construção de um país mais justo, solidário e soberano.
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