Renegociar a dívida pública,
libertar o país das amarras
da especulação
Intervenção
de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP, CT Vitória, Lisboa, Acto Público
Há precisamente um ano – face à degradação da situação
económica e social e à espiral especulativa que arrasava o país – o PCP propôs,
em alternativa, a renegociação imediata da divida pública portuguesa a par de
outras medidas que, em ruptura com o rumo ruinoso da política de direita,
assegurasse um outro caminho que, não isento de dificuldades, garantiria a
inversão da dependência externa no quadro de uma política de promoção da
produção nacional, de dinamização do mercado interno e de valorização dos
rendimentos do trabalho.
Há precisamente um ano, o PCP alertou para os perigos
e consequências que decorreriam para o país se fosse aberta a porta a um
processo de ”assistência financeira” que justamente designámos como um recurso
ilegítimo à ingerência externa.
Há precisamente um ano, o PCP denunciou essa eminente
intervenção como sendo um novo e perigoso passo que, em vez da ruptura que se
impunha com o rumo de desastre que estava em curso, visava acentuar uma
política de austeridade dirigida contra os rendimentos e as condições de vida
dos trabalhadores e do povo, a justificar a aplicação de um programa destinado
a aumentar a exploração do trabalho e a liquidar direitos sociais, a continuar
a assegurar a extorsão dos recursos nacionais em benefício daqueles que
precisamente eram responsáveis pela especulação dirigida contra o país.
Um ano depois, a situação do país aí está para provar
a razão dos alertas, das denúncias e das propostas do PCP.
Um ano depois, Portugal está mais endividado e
dependente, afundado numa recessão económica sem precedentes traduzida num
aumento exponencial do desemprego e do encerramento de empresas, saqueado nos
seus recursos e riquezas, marcado por crescentes injustiças e pelo
empobrecimento da generalidade da população.
Como o PCP previra e prevenira os usurários e
responsáveis pelo agravamento dos problemas nacionais são os que estão hoje a
usufruir do Pacto de Agressão imposto ao país e aos portugueses: a banca que,
depois da construção de lucros milionários alcançados com a especulação da
dívida pública nacional, é contemplada com mais de 12 mil milhões de euros em
nome da sua recapitalização e beneficiária de mais 35 mil milhões de euros
disponibilizados a título de garantias; os principais bancos e centros
financeiros europeus e os chamados mercados que associados ao BCE e ao FMI vêem
garantidos, à conta do empréstimo de 78 mil milhões de euros, um acrescento em
juros e comissões superior a 35 mil milhões de euros.
Montantes que, absorvendo praticamente todos os
recursos que supostamente eram invocados para acudir à situação do país, acabam
nos bolsos dos principais grupos financeiros pagos à custa da exploração e dos
rendimentos dos trabalhadores e da ruína de centenas de milhar de famílias e
dezenas de milhar de pequenas empresas.
Beneficia ainda o grande capital no seu conjunto,
nacional e estrangeiro, do esmagamento dos custos unitários de trabalho no
nosso país, da desvalorização dos salários e das remunerações, do alargamento
do horário de trabalho e de todas as outras formas que conduzem directamente ao
agravamento da exploração. Beneficiam também aqueles que, por via das
privatizações e da destruição dos serviços públicos, tomam progressivamente
conta de sectores estratégicos para o país e de novas áreas de negócio na
saúde, nos transportes ou na educação.
É urgente romper com este rumo de declínio económico,
retrocesso social, saque e de dependência externa que PSD, CDS e PS, com o
apoio do Presidente da República, estão a impor ao país.
Um rumo de desastre que as mentiras e a propaganda do
governo não iludem. Cada um dos “sucessos” anunciados pelo governo são não só a
confirmação do agravamento dos problemas nacionais como novos passos em
direcção ao abismo.
O propagandeado “sucesso” do combate ao défice das
contas públicas é a outra face do agravamento substancial das condições de vida
do nosso povo e da profunda degradação económica, ela própria geradora de novos
défices e dívidas futuras.
O propagandeado “sucesso”atribuído pelo
primeiro-ministro perante a recessão de 2011 – por alegadamente se fixar abaixo
dos 1.9 previstos – procura iludir as inquietantes previsões de uma recessão de
3.4 para 2012, bem superior aos 1.8 previstos há poucos meses atrás aquando da
assinatura do Pacto de Agressão.
O propagandeado “sucesso” sobre a redução do défice da
balança corrente, esconde o efeito económico demolidor à custa do qual está a
ser alcançado, ou seja pela redução do consumo das famílias e do rebaixamento
do nível de vida dos portugueses e, sobretudo, hipotecando o desenvolvimento e
o crescimento económico com a redução da produção que a abrupta quebra nas
importações de bens produtivos está a traduzir.
O propagandeado “sucesso”sobre um alegado
reconhecimento dos mercados financeiros do “caso português” contrasta não só
com o crescente peso dos encargos com o serviço da dívida – a crescer em valor
absoluto e em percentagem do PIB – como também na revisão das previsões sobre a
evolução da dívida pública cujo “pico” inicialmente previsto para 2013 foi já
revisto para pelo menos 2016.
O propagandeado “sucesso” sobre os sinais da retoma
económica ou do interesse do capital internacional na aquisição de empresas
estratégicas está diariamente a ser desmentido pela dramática evolução dos
números do desemprego e das previsões de destruição de emprego – mais de 200
mil para 2012 e 2013.
O irresponsável discurso do Governo sobre uma ilusória
retoma, difundido e ampliado para justificar os sacrifícios insuportáveis que
está a fazer recair sobre os trabalhadores e o povo, é desmentido por aquilo
que as estimativas que o Banco de Portugal, mês após mês, revelam: uma economia
em queda livre com níveis recorde de recessão ( com a precisão de uma retracção
do PIB de 3.4 em 2012); quebra no consumo privado (- 7.3 %); destruição liquida
de empregos (mais de 170 mil neste ano); redução de investimento (-18.9%);
desaceleração no crescimento das exportações.
Uma evolução desastrosa que é já pretexto para
renovadas investidas especulativas e novas manobras preparatórias de outra vaga
de medidas de austeridade, quer pela via do cumprimento das metas do actual
pacto, quer a coberto da necessidade de um novo resgate, como ainda há dias o
admitiu Vítor Constâncio, vice-presidente do BCE.
Uma evolução desastrosa que - para lá da propaganda e
das mentiras sobre aquelas medidas que são sempre apontadas como as últimas e
definitivas - todos os dias conhece novos desenvolvimentos e comprovação como o
atesta, entre outras o prolongamento do roubo dos subsídios de férias e de
Natal na administração pública e reformados.
Um ano depois ganham, pela prova da vida e dos factos,
actualidade as propostas que o PCP defendeu e defende no sentido de uma ruptura
com a política de direita e de uma rejeição, sem hesitações e mais demora, do
Pacto de Agressão que PSD, CDS e PS estão a impor ao país ao serviço dos
interesses do grande capital nacional e transnacional.
Uma clara rejeição do Pacto de Agressão com o cortejo
de dificuldades para o povo e os efeitos desastrosos para o país que comporta e
não, como alguns defendem, uma mera adequação do ritmo ou dos prazos da sua
execução dirigida sobretudo para tentar contornar a crescente oposição e
resistência à sua aplicação e assegurar a concretização dos seus objectivos.
A inscrição como objectivo crucial da renegociação da
dívida – e não uma mera reestruturação como alguns defendem para salvaguardar
não os interesses nacionais mas sim o dos credores – assente numa reavaliação
dos prazos, e a redução de juros e montantes. Uma renegociação indispensável
para libertar e canalizar recursos do lado do serviço da dívida para a promoção
do investimento produtivo, a criação do emprego e outras necessidades do país.
Uma renegociação que, tal como o PCP propôs, deverá
ser inseparável da avaliação da sua componente ilegítima e que requerida no
imediato, deverá garantir um serviço da dívida que seja compatível com um
crescimento económico pelo menos de 3%/ano, admitindo para o efeito a
determinação de um período de carência a definir e a indexação do valor dos
juros a pagar anualmente com esse serviço da dívida, a uma percentagem das
exportações anuais previamente fixada.
Uma renegociação agora, determinada pelos interesses
nacionais, e não um processo que, por força da descapitalização do país e face
à mais que certa impossibilidade de pagamento da dívida – como aliás aconteceu
com outros países designadamente a Grécia –, traga atrás de si novos
sacrifícios para o povo e novas investidas no saque dos recursos nacionais.
A adopção de uma política virada para o crescimento
económico tendo como eixos essenciais a defesa e valorização da produção
nacional, a valorização dos salários e reformas essenciais para a dinamização
do mercado e da procura interna e o apoio às pequenas e médias empresas, a
dinamização do investimento público, a par da aposta nas exportações de forte
valor acrescentado e na diversificação dos mercados externos.
A diversificação das fontes de financiamento,
retomando uma política activa de captação de poupança interna –
propositadamente desincentivada pela desvalorização dos certificados de aforro
(que levou a uma redução de mais de 4 mil milhões de euros só em 2011 e uma
redução a 1/3 nos últimos oito anos do seu peso na dívida pública), a par do
desenvolvimento de relações bilaterais que assegurem condições de financiamento
mais vantajosas.
O avanço para a tributação efectiva dos lucros do
grande capital, do património de luxo, da especulação financeira, indo buscar
recursos tão necessários ao desenvolvimento do país, aonde eles efectivamente
se encontram.
O termo do ruinoso processo de privatizações e a
adopção de medidas com vista a assegurar um controlo público de empresas e
sectores estratégicos.
A intervenção junto de outros países que enfrentam problemas similares de dívida pública – Grécia, Irlanda, Espanha, Itália, Bélgica,etc – visando uma acção convergente face às imposições da União Europeia destinada a barrar a actual espiral especulativa e o colete de forças que está a ser imposto aos povos com novas medidas de austeridade e limitações à sua soberania e a construir uma resposta de fundo à situação de estrangulamento económico e social dos seus países.
A intervenção junto de outros países que enfrentam problemas similares de dívida pública – Grécia, Irlanda, Espanha, Itália, Bélgica,etc – visando uma acção convergente face às imposições da União Europeia destinada a barrar a actual espiral especulativa e o colete de forças que está a ser imposto aos povos com novas medidas de austeridade e limitações à sua soberania e a construir uma resposta de fundo à situação de estrangulamento económico e social dos seus países.
O país não está condenado ao declínio económico e
social e à crescente dependência e subalternização.
A solução para os problemas do país, a salvaguarda do
futuro dos portugueses exige uma política contrária à que está a ser executada
. Soluções e saídas que passam pela consequente recusa das soluções do Pacto de
Agressão, pela ruptura com a cega submissão ao directório de potências e aos
interesses do grande capital, pelo aprisionamento de Portugal na teia da
dependência externa e do saque dos recursos nacionais.
O PCP, firmado numa determinada intervenção capaz de
afirmar o interesse nacional reforçada em cada dia que passa pelas
consequências desastrosas do rumo que está a ser imposto ao país, apresentará
uma proposta na Assembleia da República com vista à urgente abertura de um
processo de renegociação da dívida publica que liberte o país das amarras da
especulação e de submissão aos interesses estrangeiros e do grande capital.
O caminho para o abismo pode e deve ser interrompido
pela luta dos trabalhadores e do povo e pela acção convergente de todos os
democratas e patriotas, dando força a um verdadeiro projecto alternativo para o
país como o que o PCP preconiza.
O país e os portugueses precisam de uma nova política.
Uma política patriótica e de esquerda, condição para abrir uma nova fase na
vida nacional e relançar Portugal no caminho do desenvolvimento e do progresso.
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