Conferência de Imprensa: Abertura do Ano Lectivo 2011/2012
Declaração
de Jorge Pires, da Comissão Política do PCP
Novo ano
lectivo – problemas agravados pelo programa de agressão que está em curso
Na abertura do ano lectivo, o PCP chama
a atenção para o facto de este se iniciar mergulhado num oceano de problemas
que resultam de uma política educativa marcada por um ataque sem precedentes
contra os direitos constitucionais nesta área.
O maior despedimento colectivo de
professores de que há memória e a Instabilidade no corpo docente, milhares de
auxiliares de educação em falta nas escolas por não terem sido renovados os
contratos de trabalho, turmas com excesso de alunos, famílias sem saber se vão
ter apoios da Acção Social Escolar (ASE) num momento em que precisam de
adquirir os manuais e outros materiais escolares, escolas sem os meios humanos
e técnicos para poderem ajudar os alunos com maiores dificuldades, centenas de
escolas encerradas que obrigam a deslocações de dezenas de quilómetros por
parte de crianças do 1º ciclo do ensino básico e um corte de 800 milhões de
euros que se fará sentir sobretudo nestes últimos meses do ano, são alguns dos
problemas que docentes, estudantes e pais, vão encontrar na abertura do ano
lectivo.
Mas não ficam por aqui as malfeitorias
que este governo se propõe realizar na educação nos próximos anos.
Comprometido com o programa de agressão
que PSD, PS e CDS assumiram com a UE e o FMI e tal como se pode verificar no
documento «Estratégia Orçamental 2011/2015», o governo insiste nos cortes cegos
numa área que é estratégica para o país e fá-lo, com a consciência de que, ao
mesmo tempo que favorece os interesses dos grupos económicos e financeiros,
está a penalizar as novas gerações e a hipotecar o desenvolvimento futuro do
país.
Nas medidas inscritas no documento,
destacamos, pela sua gravidade: a racionalização da rede escolar assente na
constituição de mais mega-agrupamentos e no encerramento de mais escolas do 1º
ciclo do ensino básico, desta vez sem o estabelecimento de um número mínimo de
alunos; o despedimento de mais uns milhares de professores; a alteração dos
currículos, nomeadamente no ensino básico, retirando-lhes tudo o que seja
considerado «não essencial», numa perspectiva que nos faz recuar ao 24 de Abril
de 1974, quando se limitava o conhecimento das classes trabalhadoras a apenas
“saber ler e escrever”; o corte de mais de 500 milhões de euros no orçamento
para a educação em 2012, depois do corte de 800 milhões em 2011, num contexto
de grande contracção do rendimento disponível das famílias e de um aumento
significativo com os custos directos que querem impor na educação.
O resultado
final desta política cuja matriz é profundamente reaccionária, será inevitável:
diminuição na qualidade das aprendizagens e recuos significativos no combate ao
insucesso e abandono escolares.
Há muito que o PCP tem vindo a
denunciar o facto de o sistema educativo estar a ser alvo de profundas
alterações, num processo em que as classes dominantes nunca perderam a
perspectiva e nunca abandonaram o objectivo de transformar o ensino, não apenas
numa mera mercadoria, mas também num instrumento de reprodução ideológica dos
interesses do sistema associado ao aprofundamento do processo de exploração e
acumulação capitalista.
Tem sido assim com os sucessivos
governos, particularmente depois da cimeira de Lisboa em 2000, com a adopção de
medidas de privatização do ensino e fragilização da Escola Pública, colocando-a
cada vez mais em pé de igualdade com os negócios privados; com a generalização
da precarização do vínculo laboral dos professores e a desvalorização da
profissão docente; com sucessivas reformas curriculares, sempre com o objectivo
de abandonar o paradigma da formação integral do individuo, empurrando para o
ensino profissionalizante desvalorizado um número crescente de estudantes,
particularmente das classes mais empobrecidas da população; com a transferência
crescente dos custos com a educação para as famílias, levando ao abandono
precoce da escola de milhares de jovens e a profundas desigualdades nas
condições em que se desenvolve o percurso escolar de cada criança e jovem.
O mito que se criou em torno da actual
equipa ministerial e da política educativa, que se diz promover a exigência, o
rigor e a qualidade nas aprendizagens, contra o facilitismo, esbarra na
contradição insanável que se encontra na relação entre o discurso e os
objectivos que se propõem alcançar, e os resultados obtidos nos últimos anos
por outras equipas que fizeram as mesmas opções de política educativa.
O sistema educativo e a Escola Pública
estão hoje confrontados com um conjunto de problemas que só terão solução num
contexto de rejeição do programa de agressão que está em curso e de ruptura com a política de direita, abrindo
caminho a uma outra política educativa que assuma a educação como um valor
estratégico fundamental para o desenvolvimento do País e para o reforço da
identidade e soberania nacional, com prioridade para um efectivo combate ao
abandono e ao insucesso escolar e educativo.
Que rigor e exigência se pode esperar
de uma criança que tem a única refeição quente do dia na escola?
Que rigor e exigência se pode pedir a
um professor que vê a sua profissão desvalorizada profissional e socialmente, e
quando muitos vivem anualmente a incerteza quanto à manutenção do posto de
trabalho?
Que rigor e exigência se pode pedir a
um professor e aos seu alunos quando são obrigados a trabalhar em salas de aula
com excesso de alunos, como vai acontecer no ensino básico neste ano lectivo e
quando todas as opiniões especializadas apontam o contrário como caminho certo
para promover a qualidade no processo ensino/aprendizagem?
Que rigor e exigência se pode ter
quando se estuda ou trabalha em escolas em que faltam milhares de auxiliares de
educação que não viram os seus contratos renovados, profissionais
indispensáveis ao bom funcionamento das escolas?
Que rigor e exigência se pode pedir a
alunos e professores quando as escolas não têm os meios financeiros
indispensáveis ao cumprimento das suas missões, chegando mesmo, muitas delas,
ao ponto de nem sequer terem dinheiro para manter em funcionamento, o ar
condicionado no verão e o aquecimento no inverno?
Numa sociedade que se quer mais
desenvolvida e mais justa, a Educação e sobretudo a sua componente escolar, não
pode ficar capturada por aqueles cujos interesses estão centrados no aumento da
exploração e das injustiças sociais.
O país precisa de um ensino de
qualidade que cubra o objectivo da democratização e as necessidades educativas
individuais e sociais e da economia, tal como o PCP propõe. Objectivo que
requer uma coerente linha de construção de uma Escola Pública, de qualidade,
gratuita e para todos, que deve mobilizar as vontades intervenientes no
processo educativo.
Neste sentido, o PCP anuncia desde já,
a apresentação para breve de três projectos de Lei – (Um projecto de lei
para a gratuitidade dos manuais escolares; um segundo para a
constituição de gabinetes pedagógicos multidisciplinares e ainda um projecto
lei que garanta a vinculação dos professores contratados e promova a
estabilidade do corpo docente nas escolas) – que respondem à necessidade de
resolver alguns dos muitos problemas que se colocam hoje ao nosso sistema de
ensino e à Escola Pública e apela à comunidade educativa para que não se resigne
perante as dificuldades e assuma a luta em defesa da Escola Pública e do
acesso a todos os níveis de ensino e ao
sucesso escolar, como um imperativo nacional, uma luta que é inseparável da
rejeição do programa de agressão ao povo português que está em curso.
Lisboa, 9 de Setembro de 2011
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